É o ponto alto de qualquer discussão, análise ou crítica que se veja por aí espalhada em relação ao futebol, o argumento incontestável e supremo: o resultado. É também o grande responsável pela falta de evolução no discurso futebolístico e pela incompreensão sobre o que se passa em campo.
Se assistirmos a uma corrida de 100 metros no atletismo, é óbvio quem é o melhor. O resultado não mente e não há mais história para além de quem chegou primeiro. O atleta que correu mais rápido ganhou, é o mais veloz e por consequência o melhor. No salto em altura a mesma coisa: o atleta que saltou mais alto ganhou e é, portanto, o melhor.
No futebol as coisas complicam-se. Equipa A vence Equipa B por um golo de diferença. Equipa A é então a melhor? Talvez. Se repetirmos o jogo amanhã, com exactamente os mesmo jogadores, o resultado será o mesmo? Se jogarmos 10 vezes, a Equipa A ganha de todas as vezes?
Num jogo de futebol a bola rola durante 90 minutos, sendo que no final raros são os jogadores que a tiveram por mais de 2 minutos. Jogadas inteiras dependem de inúmeras decisões e execuções em menos de segundos. Quantos golos já vimos em que a bola vai ao poste e entra, em que o guarda-redes não toca por milímetros, em que o desvio no defesa sai exactamente para o sítio certo? Do outro lado, quantas bolas não entraram pelas mesmas razões?
Num jogo em que os imponderáveis, todos os acontecimentos que não podemos controlar, sucedem em tão grande número, como podemos chegar ao fim e olhar apenas para o resultado?
Se não é possível controlar o resultado face a tanta imprevisibilidade, a única coisa que podemos controlar é o comportamento ou o processo dos intervenientes. Ou seja o treinador não pode controlar que a sua equipa marque golo em determinada jogada ou não sofra noutra. Mas pode tentar controlar o modo como os seus jogadores se comportam nas diferentes situações e assim aproximar a sua equipa do sucesso.
Porque no fundo é esse, e apenas esse, o trabalho do treinador: aproximar a sua equipa do sucesso. O resto cabe aos jogadores.
Não é possível avaliar o trabalho dum treinador apenas através do resultado. Sendo um parâmetro de avaliação como qualquer outro, se não for contextualizado não vale de nada.
Partindo então para a análise dum jogo, é necessário manter a ideia de que o resultado por si não representa o valor da acção, mesmo no pormenor.
Quero com isto dizer que do mesmo modo que um jogo não é definido pelo seu resultado, uma jogada em particular também não o pode ser. Se uma jogada resultar em golo, as decisões que foram tomadas pelos intervenientes não podem ser automaticamente classificadas como boas. Vejamos, tentando simplificar:
Jogador A marca num remate fulminante a 40 metros da baliza. No entanto estava em jogo um colega de equipa do Jogador A em excelente posição, que com um simples passe ficava isolado para marcar golo. Voltamos atrás no tempo, na situação em que o Jogador A tem de decidir entre o remate ou o passe. A probabilidade de chegar ao golo a uma distância tão grande da baliza é reduzida, mesmo entre os jogadores mais talentosos. No entanto, a probabilidade de chegar ao golo através dum simples passe para um colega que fica isolado é superior, porque a finalização está ao alcance mesmo de jogadores menos dotados.
Concluímos então que, apesar do resultado (golo), a jogada podia ter sido resolvida de melhor forma, em que a probabilidade de chegar ao golo era maior. A decisão do Jogador A não foi a mais correcta.
Entender que o resultado não define o futebol é então meio caminho andado para perceber o jogo.